3.

(...) e agora, pouca diferença lhe fazia. Continuava a sentir saudade, isso era certo, e havia noites em que não conseguia dormir, pois a única coisa que precisava era de alguém que lhe ajeitasse os cobertores e lhe passasse a mão pelo cabelo enquanto lhe contava uma história de embalar qualquer com final feliz. Mas nunca ninguém vinha, e até ela própria já se convencera de que não tinha mais idade para este tipo de comportamentos. Agora dormia sozinha, agora não precisava de histórias que terminassem sempre bem, agora não precisava de se sentir protegida pelas mantas que a cobriam como uma espécie de caverna. Agora crescera e não podia ter medo de nada nem ninguém, muito menos de dormir com a luz apagada, no quarto escuro ao qual já conhecia todos os cantos.
Nessas noites, onde o sono custava a chegar, escrevia convencida de que um dia alguém iria ouvir as suas histórias com atenção, ler por entre as linhas e ver a verdadeira intenção de uma história feita à toa, trabalhada à pressa, misturando tantas palavras quantas ela quisesse, baralhando tudo num remoinho tão intenso que fazia com que quem lesse não percebesse nem um décimo do que ela escrevia.
''Tens de ser mais concisa, menos confusa.''
''Não consigo.'' dizia ela, com os dentes cerrados, como se dizer-lhe aquilo fosse o maior insulto à face da Terra.